Cruzámo-nos no limbo.
Quando morreu, em Junho de 59, ia eu no meu terceiro mês de gestação.
De certeza que o ouvi tocar (ou cantar, declamar ou polemizar... de qualquer forma, provocador) lá nessa Internet das almas, labiríntica rede onde vão circulando os que já chegaram e os que ainda não partiram. Gosto de pensar que foi a ele que perguntei a que IP me devia dirigir. Olhou a ficha ao meu aurascoço, viu que era um .pt e indicou-me a porta do router. Recomendou-me que absorvesse alguma energia para ganhar massa pr’à viagem. Deu-me ainda umas dicas para uns
bistrots e com uma gargalhada avisou:
- Se quando tiveres que ir, arrancares depressa e bruscamente, irás pela fresca, pela sombra, porque os raios do sol, com a surpresa, não te conseguirão seguir.
Boris (V), alma gémea, engenheiro, boémio, trompetista com a sua própria banda de jazz (eu não sou musico; apenas respiro bebópicamente), grande Sátrapa do Colégio da Patafisica, metafisicomático, tendo documentado o cálculo numérico de Deus, por métodos simples... amante de Paris e dos “caveaux” mágicos onde o ambiente se entranha na pele, escritor de soberbos e inverosímeis romances de amor, de novelas do absurdo real e de livros de cordel negros, poeta de intervenção e cantor pornográfico... Cultivava a liberdade das ideias e da vida.
“Je passe le plus clair de mon temps à l'obscurcir parce que la lumière me gêne. "Devo ter escutado o seu conselho, pois nasci pr’aí à uma da manhã.
Até fisicamente, dizem, deveríamos ser parecidos...
Só que não morri aos 39...
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