26 novembro, 2006

Convite à aventura

Borrascas

....a chuva cai com um ruido gritante, sustentado pelos tímbalos de ventos robustos, tentando abafar Mozart, que espraia a sua 40ª Sinfonia aqui no escritório...

...tento um novo ataque inglório ao meu autoreprodutor monte de papeis, mas a sua natureza alienígena continua a consumir as minhas energias...

Confirmou-se mesmo, aquele fim de semana submerso e desgastante.

20 novembro, 2006

Inesperadamente

Inesperadamente chegou-me aos ouvidos o soberbo ultimo disco (& DVD) do agrupamento L’ARPEGGIATA, da Cristina Pluhar, que nos leva a deambular pela musica antiga do sul da Europa (nomeadamente pelos vilancicos do Convento de Santa Cruz de Coimbra) e dos seus percursos mestiçados pela América do Sul. Um itinerário fascinante com a musica dos séculos XVI e XVII como (fio) condutor de identidade e cultura, tocando os povos e os mundos. “Los Impossibles” regista assim um surpreendente e improvável encontro.


Inesperadamente... já o tenho! Por algum misterioso e inatingível desígnio, dei com ele num escaparate antes da data prevista para o lançamento. Já fazem assim parte da familia, o Brawlers, o Bawlers e o Bastards, todos eles Orphans do Tom Waits.
E como uma esponja no banho de uma “starlet”, ando tanto a embeber-me como a deleitar-me.

13 novembro, 2006

Algumas coisas em que acredito

  • nas minhas filhas
  • e=mc2 (mesmo que a velocidade da luz tenha variado ao longo das eras) e nas leis da termodinâmica
  • no respeito como pilar das relações entre as pessoas
  • na liberdade do espirito e das ideias, e das artes como forma de as cultivar
  • no empurrar os nossos limites, sempre um pouco mais além
  • nos efeitos revigorantes das gargalhadas e do bálsamo dos sorrisos das pessoas certas nos momentos certos
  • na quimica das emoções e dos sentidos
  • na intrínseca perversidade da inocência e na ternura secreta dos marginais desamparados
  • ..................

12 novembro, 2006

Tributo (to TW)

Enquanto esperamos por "Orphans", surpreendi-me com um singelo reconhecimento. Um trio francês (uma discreta voz feminina), auto-designado significativamente de STRANGE WEATHER.

Deixo-vos um dos temas


The Fall of Troy


Ao Tom



11 novembro, 2006

Noites Claras

Largou a caneta encharcada de suor e esmagou o cigarro no cinzeiro. Empurrou este um pouco para mais longe sobre a mesa, porque não suportava os seus gritos de dôr. Quando se levantou e apagou o candeeiro preto, acendeu-o de novo e desligou finalmente o branco farto das insistentes reclamações deste de já estar em brasa por ter terminado o turno. A louça por lavar dava uma festa na banca da cozinha com entrada só permitida a casais e quando passou por perto, uma esbelta mas já gasta faca e um garfo, por sinal mais baixo e atarracado que ela, admitidos de fresco, lançavam-se radiantes para a confusão. Tinham era a musica alta demais. Todos os seus ainda ordenados utensilios de cozinha o insultavam por não lhes dar condições de participar e a sua paciência chegou, finalmente, ao seu mais dilatado limite quando o copo de cerveja, ainda meio cheio de trabalho, embora semi vazio de emoções, o impeliu a despachar-se a terminá-lo para se juntar ao arraial. Atirou-o com força à parede e lá se finou deixando uma base e um inumerável numero de cacos sem sustento, que ele recolheu com sentido sentido de responsabilidade. Saiu fechando a porta.
Agarrou o livro que começara havia pouco e foi-lhe sendo revelada a paixão que este nutria por si; colava-se-lhe às mãos, as suas linhas saltavam-lhe aos olhos e todas as suas palavras e frases lhe eram transmitidas impregnadas de luxúria mas com uma capa de lascivia. Deixou-o então ficar num canto todo derretido e foi finalmente deitar-se.
Aconchegou-se bem nos lençois frescos puxando o cobertor bem ao queixo. Quando deu por ela era já tarde. Este cercara-lhe o pescoço firmemente e dois minutos mais tarde, depois de um ultimo estremeção, adormeceu.
Ficou acordado no escuro apenas ouvindo as gotas que se largavam da torneira a estatelarem-se com entusiasmo na banheira. Sentiu-se reconfortado por ser o primeiro a acordar lá em casa.
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10 novembro, 2006

TRAMONTANA


Também Bora ou Bóreas (irmão de Zéfiro na mitologia grega). O termo pode originalmente ter significado “vento das montanhas”. Nome clássico do vento norte, frio e invernoso podendo soprar de noroeste para sudeste, dependendo das regiões, em volta da bacia mediterrânica, do norte da Catalunha à costa oeste da Itália. Neste país tambem chamado de Garigliano.


Tramontana – Os anarquistas da Catalunha fundaram em 1881 uma revista satírica, La Tramontana. Este vento, conforme ilustrado no título, sopra forte, varrendo todas as instituições e autoridade. A eterna luta da Catalunha contra a centralização do poder politico em Madrid sobressai nesta edição, datada de 22 de Maio, 1881.

09 novembro, 2006

Le Péché

«Não é esta ou aquela acção que constitui pecado, mas uma existência mal governada. Há os que pecam e os que não pecam. As mesmas coisas (odiar, foder, preguiçar, maltratar, humilhar-se, envaidecer-se) são pecados nuns, noutros não. Ter pecado quer dizer ficar convencido de que certa acção é, de um todo misterioso, criadora de infelicidade para o futuro; que tal acção ofendeu alguma lei misteriosa da harmonia e não é mais do que um elo numa cadeia de desarmonias precedentes e futuras. Viver é como fazer uma longa soma em que basta ter errado o total das duas primeiras parcelas para já não nos conseguirmos safar. Isto é, engrenar numa cadeia dentada...»


Cesare Pavese, O Ofício de Viver

Gente do Milénio (II)

(Continuação)


...então, inesperadamente, do mais discreto recanto da classe média emerge um inadaptado, um inconformado, ou talvez mesmo um desesperado (psicopata até) que assalta um banco, onde até faz reféns, dispara sobre um automobilista numa fila do trânsito, desaparece com uma quantidade de dinheiro que se supunha à sua responsabilidade, tranca uma repartição a cadeado, sabe-se lá que mais. E aí, a classe média solidarizar-se-á de compreensão pela ousadia, naquele ímpeto repentino de transgressão de legítima confrontação com o monstro (sempre durante um suficientemente curto período de tempo, devidamente controlado por este) ou em caso de comportamento aparentemente mais alucinado, algo anómalo mesmo, muito provávelmente comentará : “... ele há cada um!... Já não estamos seguros em lado nenhum!”.
Finalmente, foi também no “Público” que encontrei um novo alento na síntese de um texto de Alain Touraine : “É preciso fazer a grande aliança de tudo aquilo que não é social, já que o social se tornou quase inteiramente na zona do poder”. Como? “Mobilizando todas as memórias, todas as formas de reflexão e de sexualidade, para as opôr a esse mundo multiforme do poder...” (in “Para Onde Vão os Valores” – citado por J. Barrento – Mil Folhas, 27.10.2006).


Afinal, “O fim de um mundo não é o fim do mundo” (idem).

E eu? Onde me encaixo eu então, nisto tudo?... Na classe média, onde queriam que fosse!!...

08 novembro, 2006

Gente do Milénio (I)

Será a classe média no século XXI o equivalente ao proletariado do século passado? Será no seu seio que germinará a revolução politica e social que moldará o futuro do Ocidente, mais concretamente da Europa? Terá ela motivos, forças, oportunidades e vontade de a fazer? Dei por mim a pensar nisto após ter terminado o compêndio de subversão que é o livro do Ballard, a especular livremente com base no exemplo português.

Será que o galopante acumular de aumentos dos impostos, da electricidade, do estacionamento, das taxas de juro, ambientais, municipais, de interioridade, de litoralidade, de circulação, entre tantas, que a ela especialmente fustiga, em conjunto com a insegurança das ruas, do emprego, do futuro (carreira, pensões, condições de vida na terceira idade) a conduzirá à revolta? E o crescente aparecimento de grupos, associações, seitas e grémios (de protecção da osga azul, do comércio da banha-da-cobra, da liberalização de morais e de éticas, do alfa e do ómega), não representará tal fenómeno, um dos sintomas dessa insatisfação fervilhante? Com o autor, sou levado a concluir que, como conceito teórico, a indignação teria todas as condições para medrar e consequentemente florescer num tumulto, mas na prática, pelo menos de uma forma persistente e num período prolongado e continuado no tempo, a sua concretização é muito mais dificil, por uma variedade de razões avulsas que entretanto se me foram tornando evidentes, ajudado por alguns editoriais do jornal “PUBLICO” do passado fim de semana:

  • A classe média está demasiado confortável e acomodada nos seus previlégios, nos seus “health clubs”, com as suas férias no Nordeste (J.M.Fernandes dixit, in PUBLICO, 29.10.2006), os seus “gosto” médio e “arte” média” (J. Fiadeiro dixit, in PUBLICO, 29.10.2006), estimulada por elites formadoras e condicionadoras.
  • Ela arrisca algumas extravagâncias como forma de sobressair, como auto-referência e do seu circulo mais próximo. As suas intervenções cívicas, sociais e políticas podem ser comparáveis aos seus raides de “Jeep” em fins de semana TT, às suas actividades radicais, à sua participação iniciática em ciclos temáticos supostamente restritos, cujas obras de interpretação múltipla originam exaltações (J. Moura comentou, in PUBLICO 29.10.2006). Aquela sensação de irreverência para afagar consciências.
  • Mais preponderante que os pontos acima, o “sistema” (já quase nos tínhamos esquecido dele!...) que não a deixa sair dos carris. Haverá sempre uns media convenientemente orientadores (onde andam, neste Outono, as aves com gripe?), entretenimento polémico qb para satisfazer as opiniões divergentes, revistas de vinhos, de viagens, de carros, de decoração, sempre dispostas a ajudar o leitor a escolher o que mais se adequa ao seu gosto e interesse (sim, o leitor gosta de saber antes dos outros, quais as tendências das novas modas).
  • Os grupos, seitas, grémios e associações a que pertencem, embora os favoreçam notóriamente na sua competição com os demais, não hesitarão em triturá-los quando o “sistema” assim o exigir. E fá-lo-ão pura e simplesmente porque eles próprios se sustentam no próprio “sistema”.

(Continua)

01 novembro, 2006

ZÉFIRO


Vento suave e fresco do Oeste. Alguns conhecem-no por Ponente ou Poente. Filho de Eos (Aurora) e Astreu. Enviado pelos deuses para ajudar a frota de Ulisses a prosseguir a Odisseia.



Zephyr - Automotora a diesel, cativou os Estados Unidos emergentes da Grande Depressão com o seu design futuristico, esguio e prateado; um sonho prometedor de um amanhã sorridente. Na viagem inaugural, a 26 de Maio de 1934, bateu o record de velocidade sobre carris ao percorrer a distância entre Denver e Chicago (1633 km), sem paragens, em 13 horas e 5 minutos. Uns fantásticos 124 km/h.