Em Flagrante
De Lito já ninguém esperava nada. Para o forte mas contra o baixo, cedo envergadurara pelas tortuosas vielas do vício, a exemplo do seu irmão Lino, que um dia desaparecera sem deixar ressonâncias. Nessa noite, essas ínvias veredas convergiram no velho conservatório, arrastando-o na sua busca de algo que o permitisse afinar a sua diatónica mente. Não que a musica lhe tangasse grande coisa; bem pelo contrário, como se costuma pautar “Duro de ouvido, coração bemol”. O seu instinto soprou-lhe que aquele velho edifício não deveria ser muito vigiado.
Um prelúdio com abertura simples, entrou fácilmente e percorreu alguns intermezzos no escuro, girando claves, forçando portas, na mira de um saque só fónico. Na secretaria foi prestíssimo a localizar onde guardavam o fundo de maneio, ao qual lançou mão sem hesitações. Com a bolsa e as col cheias, experimentou ainda outra sala, onde um luar stravagante que entrava pelas amplas janelas lhe permitiu distinguir, claire e nette, a imponente vitrine com alguns instrumentos alinhados, os outros dispostos adagiamente pelo estúdio. Foi andante que chegou ao grande átrio central. Uma abóbada sustenida, uma escadaria solfégica e em redor, numa disposição que a orientava virada para o centro, voltada para ele, qual regente inesperado, uma galeria de bustos dos grandes compositores, dos mestres cantores, dos contramestres contratenores. Um solene e silencioso auditório.
Como que a iniciar a peça, uma nota plangente. Pouco depois, uma sobreposição suave de cordas e madeiras, o som enchendo em crescendo, com amplitude, a imponente câmara. Uns stacattos atonais e in-harmónicos modularam a composição.
Quando o piano, num finale maestoso e em vibratto prolongado, caiu em cima do Lito, o momento tocou de sobremaneira a exigente plateia, que estremeceu de emoção.Como ao Lito, depois dessa noite, também nunca mais ninguém viu o Lino...
Night Shadows © E. Hopper
Um prelúdio com abertura simples, entrou fácilmente e percorreu alguns intermezzos no escuro, girando claves, forçando portas, na mira de um saque só fónico. Na secretaria foi prestíssimo a localizar onde guardavam o fundo de maneio, ao qual lançou mão sem hesitações. Com a bolsa e as col cheias, experimentou ainda outra sala, onde um luar stravagante que entrava pelas amplas janelas lhe permitiu distinguir, claire e nette, a imponente vitrine com alguns instrumentos alinhados, os outros dispostos adagiamente pelo estúdio. Foi andante que chegou ao grande átrio central. Uma abóbada sustenida, uma escadaria solfégica e em redor, numa disposição que a orientava virada para o centro, voltada para ele, qual regente inesperado, uma galeria de bustos dos grandes compositores, dos mestres cantores, dos contramestres contratenores. Um solene e silencioso auditório.
Como que a iniciar a peça, uma nota plangente. Pouco depois, uma sobreposição suave de cordas e madeiras, o som enchendo em crescendo, com amplitude, a imponente câmara. Uns stacattos atonais e in-harmónicos modularam a composição.
Quando o piano, num finale maestoso e em vibratto prolongado, caiu em cima do Lito, o momento tocou de sobremaneira a exigente plateia, que estremeceu de emoção.Como ao Lito, depois dessa noite, também nunca mais ninguém viu o Lino...
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1 Comments:
Hello again!
It is usually inspiring to read your texts but this one, was particularly fun! We can imagine the joy and pleasure you felt when you wrote it: a verbal & musical sculpture... I guess we could call it art...
Your instinct sure "blows" nice things...
Have fun!
Hot Wings
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